Um Exemplo para o Brasil

 

Fala-se muito que o Judiciário brasileiro é lento, ineficiente e trabalha muito pouco; até porque seus juízes e demais funcionários cumprem jornada de meio expediente, além de terem um número ampliado de feriados durante o ano. Não há como negar a veracidade destas afirmações.

Porém, a verdade é que o problema brasileiro não se restringe (lamentavelmente) apenas ao seu deficiente Poder Judiciário. É o Brasil, como um todo, que simplesmente não funciona.

Do setor público ao setor privado, nosso País parece continuar andando, -seja em  luxuosas charretes, seja em humildes jegues- , em ritmo de (preguiçosas) tartarugas.

No dia 30 de dezembro de 2016, uma sexta-feira, todos os bancos fecharam. Foi a decretação de mais um feriado (informal) em nosso país. No dia 1 de janeiro, um domingo, como de praxe, era difícil achar um mero restaurante aberto no Rio de Janeiro, a principal capital turística brasileira.

Enquanto isso nos Estados Unidos, a nação mais rica do mundo, todos os bancos funcionaram normalmente durante todos os cinco dias da semana e todas as lojas, sem exceção, abriram em Orlando, uma das diversas cidades turísticas norte-americanas, embora se tratasse de um domingo e um (suposto) feriado.

A triste verdade é que o ano de 2017 já começou nos EUA (assim como na maioria dos países desenvolvidos do mundo) no dia 1o de janeiro, mas no Brasil, como de praxe, somente se iniciará depois do carnaval, ou seja no dia 6 de março.

No país com o maior número de feriados do mundo (dentre os oficiais, oficiosos e emendados), a FIRJAN e a Fecomercio/SP já projetam, respectivamente, prejuízos dá ordem de R$ 66.8 bilhões para a indústria e R$ 10.5 bilhões para o comércio durante o ano de 2017.

Comparativamente, através de uma análise superficial, ambos países aparentam ser muito parecidos: o território dos EUA possui 9.3 milhões de km2 (o Brasil, 8.5 km2); a população americana é de 320 milhões de habitantes (a brasileira de 210 milhões); a primeira colônia britânica em território americano (a Virgínia) foi fundada em 1606 e, portanto, os EUA possuem 410 anos de existência (o Brasil 516 anos),; a independência estadunidense ocorreu em 1776 (a brasileira em 1822). Mas as semelhanças terminam aqui. A economia norte-americana é (surpreendentemente) 10 vezes maior que a do Brasil (PIB de quase US$ 20 trilhões versus um PIB de US$ 1.77 trilhões) e os EUA se constituem em um país desenvolvido; ao passo que o Brasil em uma nação (eternamente) em vias de desenvolvimento.

O segredo do (espantoso) sucesso dos Estados Unidos é simples: eles trabalham; e trabalham duro. Suas crianças são educadas para trabalhar desde os 14 anos e é muito raro existir algum adolescente no ensino médio ou jovem universitário que não trabalhe meio expediente, especialmente nas férias de verão. Situação muito diferente do Brasil em que os filhos dá classe média   somente estudam (quando o fazem) e os dos pobres apenas trabalham (quando encontram empregos) sem qualquer planejamento para o futuro.

Ademais, a paixão americana não é nem o futebol e nem o carnaval. É a inovação e o empreendedorismo (ainda que também torçam por times de baseball e futebol americano). As maiores (e mais bem sucedidas) empresas do mundo possuem DNA americano e foram, em grande parte, concebidas em fundos de quintal (Nike, Apple, Microsoft, etc.), sem qualquer ingerência estatal.

Aliás, a derrocada de HILLARY CLINTON, frente à DONALD TRUMP, deveu-se muita mais ao seu discurso estadista (encampando ideias quase bolivarianas de BERNIE SANDERS que somente podiam ecoar em mentes muito jovens e desconectadas com o mundo real) do que propriamente a qualquer outro fator isolado, até porque o povo estadunidense sempre surfou em ondas de liberdade (e do mercado) contra as amarras e tutelas do Estado. Algo muito diferente do Brasil, onde a mentalidade do povo oscila entre uma endêmica passividade e uma preocupante e pouco objetiva proatividade delegada (muitas vezes exteriorizadas através de desordeiras e inúteis passeatas) ancorada em uma persistente exigência de providências por parte do Estado (e de seus governantes) em lugar de uma salutar iniciativa privada.

E quando se fala em tempo, a América, como eles gostam de se autodenominar, tem pressa. O outrora prédio mais alto do mundo, o Empire States, foi construído, no início dá década de 30,  em apenas um ano, ao passo que no Brasil, da atualidade, obras (públicas e privadas), de muito menor complexidade, se eternizam anos a fio e, muitas vezes, se quer se concluem.

Dentre as principais descobertas do século XX, praticamente metade foram de responsabilidade de pessoas físicas ou de empresas americanas [(o submarino (DAVID BUSHNELL, 1775), a calça jeans (JACOB DAVIS, 1871) o telefone (ALEXANDER GRAHAM BELL, 1876), a lâmpada incandescente (THOMAS EDISON, 1879), o tênis (U.S.RUBBER, 1892), o avião (irmãos WRIGHT, 1903), o fax (RCA, 1924), a energia nuclear (CHICAGO PILE-1, 1942), as armas atômicas (MANHATTAN PROJECT, 1942), o relógio atômico (NATIONAL BUREAU OF STANDARDS, 1948), o relógio de pulso eletrônico (HAMILTON, 1957) a fotocópia ( XEROX, 1959), a internet (ARPANET, 1969), O Sistema de Posicionamento Global (GPS) (GLOBAL POSITIONING SYSTEM, Governo dos EUA, 1973), o telefone celular (MOTOROLA, 1973) e a impressora 3D (CHUCK HULL, 3D Systems Corporation, 1984) etc.)].

E mesmo quando a invenção não foi de autentica origem estadunidense, a aplicação industrial foi determinada por técnica (ou tecnologia) genuinamente ianque, destacando a capacidade incontrastável dos EUA de transformar conhecimento teórico (próprio ou de terceiros) em aplicações práticas, [(pólvora (China, século IX) automóvel (Alemanha, 1886); rádio (Reino Unido, 1896); televisão (Reino Unido, 1926) etc.)].

No final do século XIX, a produção de petróleo norte-americana (representando metade da produção mundial, algo em torno de 2 milhões de barris/dia) já era (incrivelmente) equivalente a atual produção de petróleo brasileiro (quase 120 anos depois), sendo certo que os EUA continuam ostentando, até hoje, a posição de  maior produtor de petróleo do mundo (com uma produção de aproximadamente 11.6 milhões de barris/dia ou 13.2℅ dá produção mundial).

Muito embora o Brasil se autoentitule o celeiro do mundo, a agricultura estadunidense  produziu, em 2016, a hiperbólica quantidade de 365 milhões de toneladas métricas apenas de um único cereal (o milho), valor superior a toda a produção agrícola nacional , no mesmo ano, de 210 milhões de toneladas de grãos.

ALEX de TOCQUEVILLE, em 1835, ao escrever sua consagrada obra De La Democratie en Amerique, já previa um futuro brilhante para a maior democracia do mundo, irritando seus compatriotas franceses, ao também lembrar que a revolução americana (1776) havia sido anterior a revolução francesa (1789) e fonte de inspiração da mesma.

Ainda sobre o exercício democrático, vale lembrar que a Constituição americana foi a primeira Carta Política escrita e o primeiro documento legal a assegurar os direitos inerentes a pessoa humana, incluindo o direito a autodefesa. Nesse sentido, enquanto nos Estados Unidos a segunda emenda assegura que todo o cidadão possa comprar uma arma e andar armado; no Brasil,  o estatuto do desarmamento apenas permite que os bandidos posso fazê-lo. E, não obstante toda a crítica que se possa fazer sobre a violência urbana norte-americana, os principais indicadores demonstram claramente que ela é infinitas vezes menor que a brasileira. E nem há que se falar sobre a impunidade que, ao contrário dos EUA,  grassa no Brasil,  incluindo a (absurda e incompreensível) impossibilidade de se condenar (efetivamente) um homicida com 17 anos 11 meses e 29 dias de idade, em contraposição à legislação norte-americana que pune com extremo rigor os eufemisticamente chamados menores de idade.

E no quesito educação, as comparações podem soar grotescas, posto que das 100 melhores universidades do mundo, quase metade delas são norte-americanas, ao passo que não há uma única brasileira digna de constar no mencionado ranking.

Sem dúvida, estudo e trabalho árduo continuam sendo as fórmulas do sucesso não somente para os indivíduos, mas também para as nações.

Torçamos, portanto, para que o Brasil não perca as suas paixões,  mas também adquira novas que possam, através do necessário trabalho duro,  efetivamente conduzir nosso país para a prosperidade (e para o desenvolvimento econômico e social) que seu povo tanto merece.

Que possamos, enfim, seguir um bom exemplo.

 

publicado em: Revista Justiça & Cidadania, Edição 200 – Abril de 2017 (págs. 34 a 36). Disponível em http://www.editorajc.com.br/2017/04/0a98bac402ac9839779325758a8dfe88/ (ISSN: 1807-779X; Qualis Interdisciplinar / Ciências Ambientais: C)
Revista Aeronáutica, Nº 296, Jan. a Abr. de 2017 (págs. 16 a 17). Disponível em http://www.caer.org.br/portal/index.php/revista-aeronautica (ISSN: 0486-6274)

 

[1] Desembargador Federal Vice-Presidente do TRF2 e ex-membro do Ministério Público. Correio Eletrônico: reisfriede@hotmail.com